Houve uma vez, em um concorrido estacionamento de um vasto centro comercial, onde um homem percebeu um ruído incomum emanando de um recanto sombrio. Movido pela curiosidade, ele se aproximou e descobriu uma corujinha acuada na relva, com suas penas diminutas manchadas e olhares dilatados pelo pavor.
A pequena coruja parecia ter despencado de seu ninho e se extraviado entre os carros, aterrorizada com o barulho ao redor, buscando refúgio cada vez mais encolhida, O homem, que havia passado o dia trabalhando numa loja do shopping, deixou de lado a fadiga e, num gesto de compaixão, optou por socorrer a corujinha desgarrada.
Ele tinha a convicção de que o ninho da corujinha se encontrava em alguma árvore da reserva do manguezal próxima, mas com a escuridão imperante, era impossível discernir sua localização exata. Assim, decidiu levá-la consigo para casa, planejando confiar o cuidado do pequeno ser à sua filha mais nova, até que estivesse apta a retornar ao seu ambiente natural.
A filha mais nova, possuidora de um amor incondicional pelos seres vivos, recebeu a notícia com imensa alegria. Ela nomeou a pequena coruja de Dalva, que significa ‘estrela da manhã’. Sob seus cuidados diligentes, compartilharam momentos de cumplicidade e aventura. Dalva, agora havia crescido, estava pronta para alçar voo. E assim, numa noite iluminada pela lua cheia, ela partiu, deixando para trás apenas uma singela pena como recordação.
A felicidade invadiu o coração da garota. em saber que havia contribuído com a restauração da vida da corujinha. Com o passar dos anos, aquela menina alçou voo para habitar entre as estrelas. Três dias após sua partida, estranhos ruídos ecoaram do forro de PVC do quarto onde ela repousava. O pai, investigando o som, bateu no teto e observou a silhueta de uma ave majestosa. Ao adentrar o quintal, deparou-se com uma imponente coruja branca pousada sobre um tanque de concreto. Seu olhar, carregado de melancolia e exaustão, parecia realizar uma vigília solene em homenagem a alguém muito especial.
Após breves instantes, ela alçou voo, fundindo-se ao manto cinzento da tarde melancólica. Talvez, em seu íntimo, buscasse reafirmar a crença mística de que o universo preserva suas ligações, sobretudo aquelas tecidas pelo amor.
(O conhecimento é um farol na escuridão)